terça-feira, 22 de setembro de 2015

CHEGANDO EM SORTELHA, UM ENCONTRO INESPERADO: FERIDA DE AMOR...
(O início…)
Percorrendo algumas vilas de Portugal chegamos a uma aldeia  situada no alto de um monte elevado chamada Sortelha, linda aldeia ornada com penedos e barrocos, um bar estava aberto e paramos para um café, um típico senhor com camisa aberta no peito e um avental bastante usado veio nos atender e ao mesmo tempo ao perceber que éramos turista nos explicou sobre as casas construídas com pedras para ficarem expostas ao sol e que eram chamadas de "lagartixos". Falava entusiasmado sobre os costumes da região, as crenças e a economia, enquanto ouvia com atenção degustava o bolo de milho e o café com leite. Saímos dali e começamos a percorrer as ruas e vielas tipicamente medievais, a aldeia era fechada por um círculo de muralhas, tendo em seu interior um lindo castelo do século XIII. Do alto, além das muralhas, avistamos as grandes áreas dedicadas a agricultura e a pastorícia, atividades que remonta a tempos imemoriais, como explicou o senhor do bar e doçaria e garanto, é lindo percorrer as encostas e vales observando as cabradas e os rebanhos de ovelhas guiados placidamente por pastores e cães. Cenas que geralmente vemos em filmes de época. 

Seguimos as muralhas, até ao pelourinho, sentei para descansar, enquanto me refrescava, aproveitei para ler um pouco sobre o as festividades religiosas e a comemoração em honra de Santo Antão, o santo patrono dos animais,fama que adquiriu por ser exímio na arte de pastorar, cristão fervoroso doou todos seus bens e foi viver no deserto, uma historia de vida parecida com a vida de São Francisco, a ele é pedida bênção para os animais e para as colheitas, com isso pude perceber a arreigada religiosidade desta gente tão acolhedora.

 Partimos, no caminho encontramos um recanto cortado por um riacho barulhento mas que transmitia uma paz inexplicável, as grandes árvores e o verde campo convidava a caminhar um pouco e assim fizemos. O local era bastante frequentado por visitantes, era primavera, o ar abafado e quente da época convida ao banho naquelas águas geladas, caminhei um pouco sozinha, não sei explicar, mas percebia um olhar me acompanhando, virei-me e vi uma senhora distinta, trajava um saia abaixo do joelho, uma blusa de tecido leve, mas comportada, fechada com pequenos botões de perolas, segurava uma bolsa nos braços e me olhava como se admirasse de me ver tão feliz e eu realmente assim me sentia. Continuei a brincar com as pedras no caminho, era um momento meu, apanhei uma pedra achatada joguei-a no espelho d'água e ao perceber as ondinhas se formando ri lembrando do meu pai ensinando em um açude próximo da nossa casa, eu e meus irmãos, competindo para ver quem fazia mais ondas e jogava mais distante. Olhei novamente para a senhora e percebi que ainda mantinha seus olhos voltados pra mim, fiquei um pouco sem jeito, comecei a fazer o caminho de volta, e ao me aproximar da beirada do lago para pular o pequeno córrego, tive ajuda, mas ao mesmo tempo percebi que ela estava perto também pronta para me auxiliar, achei estranho porém não falei nada apenas agradeci com um olhar, foi então quando ela se aproximou e perguntou: Você é brasileira? Respondi que sim! Neste momento estávamos afastada e ela disse: Percebi, você deixa transparecer uma alegria que é contagiante e muito espontânea, você já foi a Fátima? Respondi que iríamos conhecer, então ela me abraçou chorando e me pediu: Reze por mim, prometa! Reze por mim, estou sofrendo muito, meu marido se separou de mim e meus filhos não me aceitam, errei e estou pagando por isso.


Eu estava atordoada, não esperava essa reação, as mulheres portuguesas são muito discretas, falam pouco e não são de conversar muito, eu não sabia o que dizer, apenas tomei suas mãos entre as minhas e lhe disse: Procure-o, diga que o ama, diga aos seus filhos e deixe o tempo curar a ferida. Ela então com os olhos cheios de lágrimas disse acrescentando, que já havia dito mas o orgulho e o ódio é maior, não deixando o perdão acontecer. Em seguida me perguntou se no Brasil rezo na igreja de Nossa Senhora de Fátima, eu disse que conhecia e novamente ela me pediu preces, dizendo que sua dor era muito grande, os minutos que passei ao lado dela me fez refletir muito sobre casamento, relacionamento, amor, filhos, família, tudo numa fração de segundo, me fazendo lembrar da frase de Drummond, "Eterno, é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade, que se petrifica, e nenhuma força jamais resgata..." este foi um momento assim... então,  abracei-a e fiz uma oração, rogando a Deus para lhe dar forças nesta jornada, tentei passar pra ela tudo que eu podia de energia, de amor, acreditando que isso era possível, depois da oração me afastei segurando apenas suas mãos e lhe disse: Siga em paz, vou orar por você e acredite que você é capaz, acredite que você vai ser feliz, aguarde com fé e siga seu caminho e principalmente confie no amor! 

Olhei em direção ao carro e percebi que já estava sendo esperada e me despedi, olhando-a nos olhos e baixinho lhe disse: Fique em paz…. Despedi-me e me afastei.
Entrei no carro calada, coloquei uma música suave, começamos a andar, olhei pra fora e observando aqueles campos pensei em tudo que aconteceu ali com aquela mulher no lago…. Então perguntei: Você também viu uma mulher conversando comigo? A resposta foi, sim! Respirei aliviada, então aconteceu realmente, não era imaginação ou uma visão, ela realmente existia, então a cada vila, a cada aldeia, entrava nas igrejas e rezava por ela… Por aquela mulher ferida pelo amor.... 

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